Wednesday, November 28, 2007

Aniversário




Um grupo de adolescentes conversa à mesa ao seu lado, de forma animada. De repente, aquelas risadas e brincadeiras tão típicas dessa fase da vida (e que voce costumava fazer, também) começam a irritar profundamente. Afinal, o que pode ser tão engraçado assim? Qual o motivo de tamanha felicidade?


Em seu último aniversário, voce se dá conta que o número de pessoas presentes é menor do que o ano anterior (e, com choque, percebe que esse número vem dimunuindo gradualmente). Aquelas que te acompanham e te conhecem há tempos vão desaparecendo, e as novas vão substituindo esse espaço, começando aquele tão temido ciclo social.


E você se conscientiza de todas as oportunidades perdidas de ser realmente feliz; de realmente realizar algo válido; de encontrar amor...de se econtrar .
E conclui finalmente: isso é envelhecer.

E a vela apaga-se, mais um ano.



Escrito por André Marçal

Sunday, April 01, 2007

Ventos de mudanças


Um daqueles dias...daqueles que você senta em lugar qualquer da cidade, só para sentir a brisa no rosto, um dos únicos toques que você obtém há muito tempo, e percebe que o vento que te toca traz consigo ares de mudanças.

E você vai embora dali, e não tem mais vontade de voltar, porque o vento pode se tornar vendaval. Não que a possibilidade disso acontecer seja muito alta, mas você não gosta de mudanças mesmo. Não é a mudança em si que te assusta tanto, já que você é uma pessoa adaptável à diversas situações. Mas talvez o que te incomode tanto são as consequências do mudar. Não que você irá mudar, enquanto pessoa, pois, por mais que às vezes você deseje isso mais do que qualquer coisa no mudo, você é incapaz de de se esforçar para que isso aconteça.
O que angustia é ver a mudança dos outros. É ver outros mudando e se transformando em coisas melhores, e tudo o que você pensa é: tenho que mudar também. E você tenta.
E voce tenta.

E tenta.

E nem sempre consegue. Talvez um pouco. Mas não consegue acompanhar o ritmo um tanto frenético do vento que traz mudanças. E você fica com a sensação que não é possível. Se ao menos o vento carregasse todos de uma só vez...

E você fica com aquela sensação que, infelizmente, já está se tornando estranhamente famliar (como um vizinho incoveniente): a de que o seu papel na vida é o de espectador. O de que assiste....assiste ao vento, levando os outros.

Levando pessoas que você gosta.

Às vezes para bem longe. Às vezes, não...mas mesmo assim, fazendo-as mudar, mesmo que próximas. E no palco do espetáculo da vida dessas pessoas, o seu papel é, novamente, o de coadjuvante. Aquele que sai e entra de cena várias vezes. E aquele que gostaria de ter um espetáculo só para si mesmo.

Mas não tem, ainda....ainda....


Sempre "ainda". E você repara que....ainda....é a palavra que você mais repete. Sempre.

E pessoas vão mudando. Mudando para outras cidades. Outras mudando de vida. Casando. Tendo filhos. Outras mudando de personalidade. Umas, melhorando as que já possuiam. Outras, por outro lado, se tornando auto-destruitivas.

Mas, mudando de algum jeito.
E você? Vai mudar também?

Você não sabe a resposta, mesmo tendo certeza da inevitabelidade de acontecer algum dia. Tudo o que você sabe é o vento. Tudo o que você sente é o vento. É o de mais real que existe. Mesmo invísivel aos olhos, é quase tangível.

E voce sabe que é ele quem traz a mudança. E você fica com aquela esperança (mas daquelas que, por mais desacreditadas que estejam, você sempre acredita) de que um dia seja carregado por ele.

E para bem longe.






Escrito por André Marçal

Wednesday, February 14, 2007

Pedaços de Joana

Ao final da minha adolescência, lá pelos 18 ou 19 anos, achei que seria interessante dar um pouco da minha versão sobre essa fase da vida, e sobre o turbilhão de emoções que nascem daí. Disso, "Pedaços de Joana" nasceu. Ainda imerso nesse universo juvenil (não que não esteja nele ainda), foi aparentemente fácil escrever o conto (algo que não se repetiu até hoje, alguns anos depois...). Espero que gostem.
P.S: Agora que temos uma leitora, isso aqui será atualizado de forma mais rápida, ou até o momento em que a leitora em questão nos abandonar....
Pedaços de Joana

Ela havia crescido. Sim, com certeza era quase uma mulher. Pelo menos era o que a sua família dizia. E sempre perguntavam do seu namorado, que ela teimava em dizer que não existia.
- Como não? – perguntavam seus tios e tias – Uma moça tão bonita! Ah, eu acho que você está mentindo.
Não estava, mas nunca acreditavam. Na verdade, garotos ainda não a interessavam. O motivo, ela ainda não sabia. A única coisa a que tinha certeza era que alguma coisa estava errada. Talvez fosse com ela, ou talvez com a sua família. Mas algo definitivamente estava errado. E Joana só foi compreender quando sentiu o sangue ainda quente escorrendo pelos braços, pingando nos cacos espalhados pelo chão...

O fato era que, com catorze anos recém completos, Joana atraía olhares aonde quer que passasse. Alta para idade, seios fartos, cabelos negro-lisos, que despencavam até metade de suas costas, e olhos cor de mel, Joana tentava esconder com roupas largas e folgadas algo que já estava se tornando óbvio para todos: estava se tornando moça. Mas ser uma moçinha (como sua família a chamava) era tão chato! Ela nem podia mais fazer as coisas que adorava. Não podia mais assistir desenhos na televisão; não podia mais brincar de pique - esconde na rua (ninguém queria mais); e ainda teria que jogar todas as suas bonecas fora!
- Mas, por que eu não posso ficar mais com elas, mãe? – perguntou Joana um dia à mãe, quando foi surpreendida mexendo nas bonecas em seu quarto.
- Ah, Joana! Moças da sua idade não brincam mais de bonecas – disse, seca, a mãe - Por que é que você não vai na festa com as suas amigas?

Mas Joana nunca ia. E não entendia o que de tão especial as outras meninas da rua viam nessas festas. Ela não entendia. A única coisa que conseguia perceber era que, pouco a pouco, ia perdendo todas as suas amizades para os ficantes, rolos, eventuais namoros, carros, boates, roupas e bijuterias. E ela não conseguia se interessar por tudo isso; talvez não tudo de uma vez só. Às vezes, Joana achava tudo tão superficial. As vezes, achava que não fosse real. Mas sabia que a solidão que sentia nas noites mal dormidas era de verdade, pois sentia as lágrimas pelo rosto.
- Por que você não namora o Pedro, Joana? – perguntou, um dia, Ritinha, a única garota da rua que ainda conversava com ela.
- Ué, não sei.
- Ele tá doidinho em você. Super afim!
- Por que você namora o João? É por que você ama ele?
- Ai, claro que eu não amo ele, Joana! Cada pergunta!
- Então, por que você namora ele?
- Ué, não sei! Pra ficar com alguém. Pra....ah, você sabe...

E Joana ia vivendo assim. Sem saber responder as perguntas, e sem obter as respostas para aquelas que fazia. Ninguém sabia responder: nem suas amigas, nem seus pais, nem seus tios, tias, primos mais velhos, nem seus professores. Nenhum deles dava uma resposta satisfatória. E Joana estava cansada.

Diziam que já era moça, quase uma mulher. Mas se olhando, completamente nua, no espelho do banheiro, Joana não concordava. Ela sabia que a pessoa do reflexo era ela, mas não a reconhecia. Quem era aquela? Parecia uma total estranha. E Joana não quis mais aceitar a estranha do espelho. Com ódio, Joana esmurrou a imagem. Com estrondo, vidro se despedaçou.

Com o sangue quente saindo dos dedos, escorrendo pelos braços, e pingando no chão, Joana finalmente compreendeu. Era, sim, moça, quase mulher. Mas também era menina. Aquela menina que brincava saltitante pela casa; aquela que tinha sonhos de ser artista de tv; aquela que sua mãe fazia carinho no sofá, antes de dormir; aquela menina que era feliz.

E chorou como menina, enquanto juntava os cacos espalhados pelo chão. Aqueles que eram os seus pedaços. E com eles na mão, jurou que tentaria junta-los e começaria de novo.
Escrito por André Marçal