Sunday, February 15, 2009

Pertencer




Daí você cresce e amadurece um tanto mais rápido do que esperava. E, apesar das evidentes vantagens de todo esse complicado processo, de alguma forma as desvantagens acabam se destacando.

Daí, você vai ao mais novo lugar badalado da cidade, e não consegue conter uma sensação das mais estranhas: de que, de repente, alí não é muito o seu lugar. Tudo soa tão esquisito, fora do lugar, meio caótico...alguma coisa ali não faz muito sentido. Talvez seja a música que não te agrade tanto; ou o esforço troiano de se fazer ouvido; ou as pessoas que não são lá das mais interessantes. A coisa mais evidente que você consegue perceber é um sabor de artificialidade pairando no ar. Tudo parece ser um grande desfile de moda. As pessoas se comportam como se estivessem naqueles comerciais infames de cerveja. Ou em um clip de Hip Hop. E, apesar do esforço, você não consegue se divertir.

Daí você entende a razão pela qual as suas fotos não têm tantas pessoas reunidas. E porque seu celular só toca quando o despertador dispara.

A velha questão volta a rondar a sua cabeça: até que ponto a qualidade se sobrepõe à quantidade?

André Marçal

Thursday, February 05, 2009

Todos os lugares

Ando cansado de te ver em todos os lugares. Cansado de ver seu rosto, ao longe, em todas as que são parecidas com você. Cansado de ver seu cabelo caindo em ombros que não são os seus. Cansado dessa sensação que mistura excitação e frustração em um milésimo de segundo, quando percebo que não é você.

Cansado do impulso de te ligar de repente, só para ver sua reação. Cansado de ponderar entre sair por aí te procurando ou deixar as coisas como estão. Cansado de me pegar desejando esbarrar com você em todos os lugares que eu vou.

Cansado de pensar em você.
Em saber que não superei nada em relação a nós dois.


André Marçal.

Monday, February 02, 2009

Especial

Ele saía pelas ruas sozinho sem destino aparente. Gostava de perceber um certo caos que controlava todas as coisas: o semáforo mandando em todos os carros; os vendedores chamando a atenção dos pedestres para os seus produtos; os pássaros alçando voôs ligeiros por causa da pressa das pessoas...Ele gostava de observar tudo, tentando não passar nenhum detalhe desapercebido.

Ele gostava de fazer suas refeições sozinho. Apreciava a forma como as pessoas interagiam umas com as outras. A mãe cuidando dos filhos. Os irmãos brigando por um motivo fútil. Amigos jogando conversa fora. Gostava particularmente de ver os namorados trocando beijos apaixonados; discutindo o que ele imaginava ser planos para o futuro ou juras de amor eterno.

Mas, era particularmente nessas horas que ele começava a sentir uma certa inquietude, um princípio de tristeza...uma certa melancolia o abatia, e parecia que a esperança havia fugido sem deixar vestígios. Ele tentava buscar dentro de si explicacões para suas atitudes misteriosas, as quais o deixavam sempre a margem de todas essas pessoas. Parecia a ele que nunca o seu momento chegaria. Nunca deixaria de observar e seria observado ao invés.

E ele pensava em todas as coisas em que ele suspeitava ser especial, diferente. Naquilo que o distinguiria de todas as outras que ele tanto observava. Ele pensava em todas as fotos que tirava por suas andanças por esse mundo, mas não conseguia deixar de achar todas medíocres. Pensava em todas as coisas que escrevia, mas nenhuma o agradava. Pensava em todos os filmes maravilhosos que assistiu, mas se se sentia triste por ser incapaz de escrever algo semelhante. Pensava em todas as músicas que eram o seu vício saudável, e se frustrava por ter quase certeza de que esse não era um de seus talentos.

Ele sabia que se existia uma verdade incontestável nessa vida, era a de que, invariavelmente, alguém era sempre melhor de que ele.
Ele sabia sobre a outra verdade, mas ainda era cego à ela...já o haviam alertado, mas ele ainda não conseguia enxergar o especial no que há de mais banal nessa vida.

Enquanto isso, ele saía por aí, observando....

André Marçal