Ao final da minha adolescência, lá pelos 18 ou 19 anos, achei que seria interessante dar um pouco da minha versão sobre essa fase da vida, e sobre o turbilhão de emoções que nascem daí. Disso, "Pedaços de Joana" nasceu. Ainda imerso nesse universo juvenil (não que não esteja nele ainda), foi aparentemente fácil escrever o conto (algo que não se repetiu até hoje, alguns anos depois...). Espero que gostem.
P.S: Agora que temos uma leitora, isso aqui será atualizado de forma mais rápida, ou até o momento em que a leitora em questão nos abandonar....
Pedaços de Joana
Ela havia crescido. Sim, com certeza era quase uma mulher. Pelo menos era o que a sua família dizia. E sempre perguntavam do seu namorado, que ela teimava em dizer que não existia.
- Como não? – perguntavam seus tios e tias – Uma moça tão bonita! Ah, eu acho que você está mentindo.
Ela havia crescido. Sim, com certeza era quase uma mulher. Pelo menos era o que a sua família dizia. E sempre perguntavam do seu namorado, que ela teimava em dizer que não existia.
- Como não? – perguntavam seus tios e tias – Uma moça tão bonita! Ah, eu acho que você está mentindo.
Não estava, mas nunca acreditavam. Na verdade, garotos ainda não a interessavam. O motivo, ela ainda não sabia. A única coisa a que tinha certeza era que alguma coisa estava errada. Talvez fosse com ela, ou talvez com a sua família. Mas algo definitivamente estava errado. E Joana só foi compreender quando sentiu o sangue ainda quente escorrendo pelos braços, pingando nos cacos espalhados pelo chão...
O fato era que, com catorze anos recém completos, Joana atraía olhares aonde quer que passasse. Alta para idade, seios fartos, cabelos negro-lisos, que despencavam até metade de suas costas, e olhos cor de mel, Joana tentava esconder com roupas largas e folgadas algo que já estava se tornando óbvio para todos: estava se tornando moça. Mas ser uma moçinha (como sua família a chamava) era tão chato! Ela nem podia mais fazer as coisas que adorava. Não podia mais assistir desenhos na televisão; não podia mais brincar de pique - esconde na rua (ninguém queria mais); e ainda teria que jogar todas as suas bonecas fora!
- Mas, por que eu não posso ficar mais com elas, mãe? – perguntou Joana um dia à mãe, quando foi surpreendida mexendo nas bonecas em seu quarto.
- Ah, Joana! Moças da sua idade não brincam mais de bonecas – disse, seca, a mãe - Por que é que você não vai na festa com as suas amigas?
Mas Joana nunca ia. E não entendia o que de tão especial as outras meninas da rua viam nessas festas. Ela não entendia. A única coisa que conseguia perceber era que, pouco a pouco, ia perdendo todas as suas amizades para os ficantes, rolos, eventuais namoros, carros, boates, roupas e bijuterias. E ela não conseguia se interessar por tudo isso; talvez não tudo de uma vez só. Às vezes, Joana achava tudo tão superficial. As vezes, achava que não fosse real. Mas sabia que a solidão que sentia nas noites mal dormidas era de verdade, pois sentia as lágrimas pelo rosto.
- Por que você não namora o Pedro, Joana? – perguntou, um dia, Ritinha, a única garota da rua que ainda conversava com ela.
- Ué, não sei.
- Ele tá doidinho em você. Super afim!
- Por que você namora o João? É por que você ama ele?
- Ai, claro que eu não amo ele, Joana! Cada pergunta!
- Então, por que você namora ele?
- Ué, não sei! Pra ficar com alguém. Pra....ah, você sabe...
E Joana ia vivendo assim. Sem saber responder as perguntas, e sem obter as respostas para aquelas que fazia. Ninguém sabia responder: nem suas amigas, nem seus pais, nem seus tios, tias, primos mais velhos, nem seus professores. Nenhum deles dava uma resposta satisfatória. E Joana estava cansada.
Diziam que já era moça, quase uma mulher. Mas se olhando, completamente nua, no espelho do banheiro, Joana não concordava. Ela sabia que a pessoa do reflexo era ela, mas não a reconhecia. Quem era aquela? Parecia uma total estranha. E Joana não quis mais aceitar a estranha do espelho. Com ódio, Joana esmurrou a imagem. Com estrondo, vidro se despedaçou.
Com o sangue quente saindo dos dedos, escorrendo pelos braços, e pingando no chão, Joana finalmente compreendeu. Era, sim, moça, quase mulher. Mas também era menina. Aquela menina que brincava saltitante pela casa; aquela que tinha sonhos de ser artista de tv; aquela que sua mãe fazia carinho no sofá, antes de dormir; aquela menina que era feliz.
E chorou como menina, enquanto juntava os cacos espalhados pelo chão. Aqueles que eram os seus pedaços. E com eles na mão, jurou que tentaria junta-los e começaria de novo.
Escrito por André Marçal
8 comments:
A leitora em questão agradece pela atualizações .. mas cadê o texto do Paulo?? .. Ele realmente acha que pode sumir assim... vou precisar puxar a orelha dele tb ...rsrs
Que chiquerrimo... tem meu nome aqui ... ahhhhhhh fiquei até sem fala agora ... seja la o que fizeram .. ou não fizeram vcs dois são dois lindos ..rsrsrs
Bom vamos so comentário sobre o texto em questão ... ta preciso ler ele mais uma duas ou três vezes .... mas tirando alguns detalhes e acrescentando outros ... me reconheci muito nele ...talves faltasse um pouco mais de sutileza pra entrar verdadeiramente no universo feminino que é um pouco mais complexo do que o que vc escreveu ... Mas isso é algo que leva tempo .. e se o texto foi escrito aos 18 19 anos .. deve receber os meus parabéns por conseguir pelo menos escrever com os olhos de uma menina ... so uma coisa: pras meninas esse "dilema" normalmente ocorre aos 11 12 anos... aos 14 o "inferno astral" é outro ... rsrs
ei!
tem mais uma leitora aqui.. a partir de hoje.
vai ter que atualiza-lo mais vezes então...
gostei bastante do texto.
sabe uma coisa .. o seu texto me lembrou do Fronteiras do Universo. Sabe aquela discusão, na comunidade, sobre qual era o pecado? Então sempre pensei no pecado do livro como uma forma de algo que se quebra... tanto no seu texto qto no Fronteiras.. o "pecado" talves seja isso o fato de crescer .. de perder algo da infância .. uma ligação mais profunda mas sem consciência consigo proprio .. lembra que a Lyra conseguia ler o aleotometro e depois deixou de conseguir.. a unica mudança foi ela ter crescido .. era preciso perder algo para ganhar outro.. e assim é a vida .. a gente perde coisas da infância pra ganhar maturidade ... o peter pan tb teve que fazer a mesma escolha ..
Eu acho que fiquei com um dos vários pedaços de Joana nas mãos na adolescência. :)
achei meio triste :)
Mãe, porque eu não posso mais assisitir bob esponja?
Mãããããããããããããããe, praque as pessoas trabalham?
Manheeeeeeee, só mais cinco minutinhos, vai... O bobo do meu chefe não vai sair do lugar...
hehehe
Enfim, senhor "meu ex-terapeuta orkústico", eu também me RECUSO adultescer...
Ser adulto é tão chato!
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